sábado, 14 de dezembro de 2013

“Temporário 12”
de Destin Cretton

Interrupção (in)voluntária da existência



Um dos grandes vencedores da mais recente edição do SXSW Film Festival, tendo também arrebatado os maiores galardões no Los Angeles Film Festival e no Locarno Filme Festival, “Temporário 12”, escrito e realizado por Destin Cretton é, sem dúvida, uma das mais comoventes peças cinematográficas de 2013 e que tem num elenco praticamente desconhecido do grande público a sua grande mais-valia.

Com um perfil assumidamente indie onde a câmara subjetiva de Cretton ousa entrar na mente dos personagens através de muitos e ajustados grandes planos, “Temporário 12” centra a sua narrativa num centro de acolhimento temporário para adolescentes com um comportamento socialmente desviante que escondem dentro das ainda tenras existências segredos, medos e cicatrizes que os impedem de encarar o futuro de forma risonha.

De forma a conseguir uma ponte entre os jovens, a instituição e a vida fora das suas paredes, Grace (Brie Larson) é uma das mais dedicadas monitoras do centro e tem na sua relação apaixonada com o colega Mason (John Gallagher Jr.) um ponto de equilíbrio para a sua vida também ela manchada com alguns dos tormentos que assolam alguns dos adolescentes internados.

Enquanto alguns dos membros da comunidade lutam dentro de si para conseguir ganhar a necessária coragem para o inevitável abandono da instituição, outros estão a chegar. Se, por exemplo, o revoltado Marcus (Keith Stanfield) vê no festejo do seu 18 aniversário uma fronteira entre a desejada liberdade e o medo desse sentimento, a recém-chegada Jayden (Kaitlyn Dever) não esconde a raiva que lhe rói a alma, sensação essa também parceira de vida de Grace que se revê na atitude desesperada da jovem nascendo assim uma poderosa ligação entre ambas.

De alma e corpo entregue às responsabilidades profissionais, Grace não consegue ser tão pragmática na sua vida e relacionamento com Mason como o faz junto dos membros do centro de acolhimento sendo que os fantasmas do passado impedem que presente e futuro sejam formas verbais presentes no seu vocabulário.

Envolto de uma sensibilidade desarmante, “Temporário 12” coloca a nu os fantasmas e o reflexo dos sentimentos recalcados nas mentes perturbadas dos seus personagens que têm nos já referidos grandes planos um espelho da sua perversidade. Ainda assim entre cenas em que unhas castigam a carne e a automutilação se assuma como um poderoso grito de revolta, existe espaço para diálogos onde o humor, a partilha e a vontade de viver consigam resgatar laivos de uma ténue esperança.

Nesse aspeto o personagem encarnado pela excelente Brie Larson é sublime e Grace consegue criar fortes laços e elevados níveis de cumplicidade ao expor as próprias fraquezas conferindo às jovens almas solitárias uma crescente sensação de “conforto”, pertença e amor-próprio. No fundo “Temporário 12” dá a conhecer vidas sufocadas pela omnipresença da dor psicológica que se estende ao patamar físico.

Para além da mestria de Cretton, convém realçar a importância da banda-sonora de “Temporário 12” da autoria de Joel P. West que em toda a sua plenitude tem como propósito e significado algo mais que uma mera transposição entre cenas. Aqui, a música, muitas vezes num registo acústico ou envolto de uma simplicidade semelhante, representa sentimentos e emoções delicadas e que completam o perfil dos personagens. Se noutros filmes as canções possam transmitir ações e pensamentos impercetíveis pela representação dos atores, em “Temporário 12” West completa as pessoas presentes na tela através dos vários acordes e sons.

Repleto de emoções, honesto, apaixonado e arrebatadoramente simples, “Temporário 12” tem, obrigatoriamente, de figurar entre as listas dos melhores objetos cinematográficos de 2013 sob pena de se ostracizar aquilo que melhor traduz a arte de fazer cinema e que é a “simples” partilha de sentimentos puros.

In Rua de Baixo

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