segunda-feira, 30 de julho de 2012

Mariza
Cascais Music Festival

Com a Mouraria na Alma




Passavam 14 minutos das 22 horas quando, pelo lado esquerdo do palco, Mariza - a nossa Mariza - entra em palco. Trajando de rojo, visual «moicano» e elegante, e altiva como só ela consegue ser, saúda o muito bem recheado Hipódromo António Manuel Possolo com Boa Noite Solidão, uma das mais marcantes músicas do seu mais recente trabalho, “Fado Tradicional”. Acompanhada na guitarra portuguesa por José Manuel Neto, na guitarra acústica por Diogo Clemente (também produtor de “Fado Tradicional”) e no baixo por Marino de Freitas, Mariza continua com Fado Vianinha. Depois, devagar, devagarinho, chega a lindíssima A Menina dos Meus Olhos, outra das pérolas do já referido trabalho de 2010.

Confiante, notoriamente feliz e - por que não dizê-lo - mais bonita, Mariza presta a sua primeira homenagem da noite, recaindo a honra no malogrado Max, e faz soar Já me Deixou. A saudade, essa, andou com todos os privilegiados que assistiram a mais uma excelente prestação da fadista, que agora abraça as raízes africanas que lhe correm no sangue em “Beijo de Saudade”, com cheirinho a Cabo Verde, mas, infelizmente, sem Tito Paris. Nesta altura, para além das habituais cordas, é a vez da bateria de Vicky Marques brilhar e dar um toque mais groove ao espetáculo. O casamento entre guitarras, baixo e bateria é perfeito e deste feliz enlace resulta um momento excelente.

Segue-se “Barco Negro” e, pela primeira vez, Mariza pede a interação do público. À vez, vozes masculinas e femininas, ainda que tímidas ao início, acompanham a fadista que reclama um “bocadinho mais” das gargantas dos presentes. Rendido, o público vê-se agora assaltado com mais um exemplo do fado com cunho pessoal e Meu Fado Meu, bastante aplaudido, relembra o álbum “Transparente”. No final do tema, a voz dá espaço à música e, aproveitando a deixa, Mariza entrega o palco aos músicos que, entre guitarras e baixo, oferecem um instrumental muito saudado.

De regresso ao palco, Chuva, um dos temas que mais palmas arrancou, faz-nos recuar até ao seu primeiro registo, “Fado em Mim”, e foi cantado com Mariza sentada entre guitarras. D. Rosa, poema de Fernando Pessoa, é mais um exemplo de “Fado Tradicional” e antecede a lindíssima Alfama, do álbum “Terra”. Segue-se Rosa da Madragoa e sente-se um cheirinho ao bairrismo da Lisboa capital. Num palco que é seu por mérito e justiça, Mariza aproveita a ocasião e cumprimenta e agradece a presença de todos, mas é, acima de tudo, o público que agradece a quem, cada vez mais, é o expoente do sentimento português de cantar.

Seguem-se Mais Uma Lua e Primavera, esta última um dos amores confessos da fadista, e o público responde com uma das maiores ovações da noite. Aos primeiros acordes de Rosa Branca todos batem palmas, Mariza dança, swinga, a festa prossegue e, mais uma vez, a audiência, agora já menos tímida, é posta à prova. É em clima festivo que chega Feira de Castro, única incursão da noite a “Fado Curvo”, que ganha outra cor com um solo de bateria de fazer inveja a muitos concertos de rock. Com Promete, Jura são muitas as mãos que se unem, são muitas as vozes que cantam a paixão.

A fama que, merecidamente, Mariza conseguiu não só em solo nacional faz-se notar com a presença de muitos estrangeiros na plateia e não é de estranhar que do palco se agradeça o carinho em inglês. Aproveitando o espírito, o público é presenteado com duas versões fantásticas, uma em português com açúcar (Fascinação, de Elis Regina), a outra em castelhano (Te Extraño, do mexicano Armando Manzareno Caché).

Já com quase hora e meia de emoções fortes, soam os primeiros acordes do clássico Ó Gente da Minha Terra, da rainha Amália, e Mariza deixa o palco, sai do «pedestal», e caminha por entre o público, cara a cara, e encanta, sorri, irradia felicidade. Distribui beijos, agradece a presença, está feliz. O público também.

O regresso ao palco, habitat cada vez mais natural desta moçambicana alfacinha que em tempos se definiu como “cantadeira de fados”, dá-se com nova incursão a Rosa Branca, agora com uma roupagem ainda mais festiva que consegue arrancar todos das cadeiras. E à meia-noite certinha, qual conto de fadas, a magia termina no palco mas vai, certamente, perdurar nas almas das gentes que se deslocaram a Cascais na noite de ontem para assistir ao último concerto do Cascais Music Festival deste ano. Obrigado Mariza e até à próxima.

In Palco Principal