terça-feira, 15 de julho de 2014

Lana del Rey
"Ultraviolence"

Cara ou coroa?



A primeira frase de “Cruel World”, faixa que abre “Ultraviolence”, o trabalho mais recente da norte-americana Lana Del Rey, serve como um cartão-de-visita. De uma forma dolente, lasciva, Lana canta: “Share my body and my mind with You”. Mas será que é desta que vamos conhecer, realmente, Lana Del Rey? Estaremos perante um estado de genuína entrega ou a assistir a um bem desempenhado desempenho dramático de Lizzie Grant, graça com que foi batizada a autora de “Born to Die”?

A produção deste disco esteve a cargo de Dan Auerbach, ilustre membro dos The Black Keys, mas as diferenças sonoras em relação, por exemplo, a “Born to Die” não são muito significativas. Seguindo, em parte, a filosofia sonora do EP “Paradise”, “Ultraviolente” é atmosférico, orquestral, com a voz de Lana Del Rey a ir de encontro a um registo etéreo, que em determinados momentos lembra Tori Amos ou entra numa espiral surrealista que não destoaria do universo de um Chris Isaak - versão feminina.

Ao longo da sua carreia enquanto cantora, Lana Del Rey edificou e alimentou uma imagem com acentuado dramatismo, e a sua música segue esse desígnio, seja ele o de uma menina mimada ou de uma atrevida e trashy “Brooklyn Baby” - também título de uma canção de “Ultraviolence”.

Logo na primeira composição do disco, a já referida “Cruel World”, nota-se uma tentativa melódica que nos leva (ou pretende levar) para uma dimensão emocional profunda, que tanto se cola a uma teatralização ou a uma peça de semblante genuíno. Tentar identificar até que ponto Del Rey é “sincera” neste álbum é o desafio maior de “Ultraviolence”. À medida que a ouvimos, oscilamos entre a vulnerabilidade e a confiança inabalável. Ainda assim, esta bipolaridade é servida através de uma tensão uniforme. Tome-se como exemplo dessa atmosfera “Fucked My Way Up to the Top”, um exercício sussurrado,sinónimo de um sentimento de perda, mas que pode perfeitamente fazer parte de uma cena dramática, pois, nas palavra e voz de Del Rey, “this is my show”.

As faixas de “Ultraviolence” têm no seu cerne a sombra de relações perdidas, de amores que acabam em tristeza e vazio, e esta constância temática acaba por cair na excessiva repetição lírica. Lana é uma “Sad Girl” e o seu estado normal é “Prettt When You Cry”. Estamos longe do glamour de “Born to Die” e abraçamos a epifania da desgraça através de infidelidades, desgostos de amor e problemas relacionados com drogas. Numa epifania depressiva, “Ultraviolence” eleva o drama emocional até o mesmo se tornar, como já dissemos, (in)suportavelmente repetitivo. A determinada altura, leva-nos mesmo a perguntar onde está a influência de Auerbach? Serão, por exemplo, os ecos de guitarra, ao fundo, em faixas como “Money Power Glory”?

Aquilo que se nota é a sistemática tentativa de criar uma atmosfera dramática. É certo que estamos perante um disco com bonitas canções, mas que não nos enfeitiçam, que não deixam a sua marca, devido ao seu perfil matemático, calculado, esperado e, por isso, monótono.

Mas tal não quer dizer que “Ultraviolence” não apresente temas interessantes. “Ultraviolence”, a faixa, “West Coast” e “Old Money”, esta última servida à base de um piano delicioso, mostra que Lana Del Rey tem facilidade em transformar algumas canções em episódios memoráveis tal, como já provou anteriormente com “Video Games” ou “Born to Die”.

Ainda que não seja desta que vamos entender quem é, na realidade, Lana Del Rey - se uma personagem ou um clone de si mesma - “Ultraviolence” prova que a menina Lizz tem uma excelente voz e uma áurea extremamente pop, onde o glamour é procurado como um alicerce que segura um edifício. A provar isso mesmo está “The Other Woman”, uma versão de uma canção popularizada por gente como Nina Simone ou Jeff Buckley.

Ainda que não seja um grande disco, “Ultraviolence” tem o condão de mostrar outra faceta (ou a realidade) de Lana Del Rey, uma artista cujo sucesso é partilhado pelo tempo de antena que os media lhe dedicam, assim como pelo seu talento. Acima de tudo, estamos perante um disco recomendado para o final de um dia quente de verão, depois de uma jornada de banhos, sejam eles de sol ou de mar, como uma viagem a um universo onírico que mistura diferentes trópicos.

Alinhamento:

01.Cruel World
02.Ultraviolence
03.Shades of Cool
04.Brooklyn Babe
05.West Coast
06.Sad Girl
07.Pretty When You Cry
08.Money Power Glory
09.Fucked My Way Up to the Top
10.Old Money
11.The Other Woman

Classificação do Palco: 6,5

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