quinta-feira, 13 de junho de 2013

QUEENS OF THE STONE AGE
“LIKE CLOCKWORK”

Sessões do deserto



Josh Homme é, sem dúvida, uma das figuras de proa do novo rock. Ao longo da última década e meia cativou adeptos com os seminais Kyuss e é desde 1997 o grande mentor dos Queens of the Stone Age. Para além destas duas bandas espalhou charme em forma de acordes pesados e riff’s sincopados em projectos “laterais” como os Eagles of Death Metal ou Them Crooked Vultures, banda pela qual editou o seu último trabalho antes de regressar com o muito aguardado “Like Clockwork”.

Este longo hiato levou muita gente a desesperar por novidades por parte dos QOTSA mas Homme, à conta do seu trabalho e entrega, ganhou credibilidade para fazer as pausas que entender, para repensar a (sua) música.

Este é um dos privilégios de se ser e sentir estrela, definição que dentro do espectro rock partilha com o seu amigo de longa data e fonte de inspiração Dave Grohl. Faces não muito distintas de uma mesma moeda sonora, entre Homme e Grohl existe uma ténue linha que os separa, uma estreita fronteira que se chama pop.

Analisando grosso modo o percurso dos QOTSA e dos Foo Fighters vemos que a genialidade que acompanha ambos os projectos encontra a sua maior diferença na franca habilidade do antigo baterista dos Nirvana para fazer hinos pop, se quiserem, power pop.

Sempre que Homme colabora com Grohl a música ganha novos patamares de interesse e “Like Clockwork”, um disco feito com muitas participações, reflecte a magia destes dois homens. A soma entre a maior dureza de Josh e a técnica mais polida de David resulta num trabalho quase sem mácula e que aponta a doses massivas de entretenimento assim como de good and old rock and roll!

Assim, e sem grandes surpresas, estamos perante mais um excelente disco, registo que abraça com todo o orgulho as várias vibrações rock e que se serve de muitos dos ensinamentos herdados dos já longínquos anos 1970, época bastante prolífera em sons bombásticos.

Para fazer nascer “Like Clockwork”, Homme voltou a chamar Grohl para a bateria, convocando também Nick Oliveri para as quatro cordas e Mark Lanegan também correspondeu ao chamamento. Para além destes nomes surgem mais convidados como Trent Reznor, Jake Shears (Scissor Sisters), Alex Turner (Artic Monkeys) e, sim, Sir Elton John para dar voz e umas pitadas de piano.

Hábil em juntar talentos diversos, Homme conseguiu um som fluído e altamente atraente ao longo de “Like Clockwork” e ouvindo as 10 músicas deste disco parece que estamos perante uma banda que se conhece há décadas. Um pouco distante dos sons gerados aquando de “Era Vulgaris”, trabalho datado de 2007, “Like Clockwork” soa mais tranquilo, seguro e completo. Começa com uma sedutora e doom «Keep Your Eyes Peeled», nascido dos cacos de um passado sonoro que vê a Fénix ressurgir, tendo como base uma linha de baixo muito quente e uma bateria (aqui a cargo de Joey Castillo) quase em velocidade cruzeiro. A tensão sente-se e, aos poucos, os curtos riffs apontam uma vontade, ainda que contida, de explodir.

Estamos perante uma atmosfera prog vibe raptada aos anos 1970 e que faz crescer o apetite ao que ai vem.
E aos primeiros acordes acordes de «I Sat by the Ocean» voltamos a sentir o prazer de estar a ouvir os QOTSA, donos de um groove a toda a prova que se prolonga ao longo dos 45 minutos de “Like Clockwork”. A guitarra grita devagar e a voz de Homme está mais segura que nunca, assim como a sua lírica fluida.

A mais contida «The Vampyre of Time and Memory», assente num piano indigente e numa guitarra que se lança no espaço, faz lembrar uma canção de Bowie e a voz de Homme não está muito longe do registo do “Camaleão”. Para dar ainda mais aconchego ao ritmo lânguido desta canção surgem pitadas de sintetizador. A música cresce nas mãos dos QOTSA.

Ainda que o som este disco soe a “rock moderno”, são muitas as referências a sons mais datados com, por exemplo, «If I Had a Tail», uma composição dona de um ritmo viciante que tem no «Da Doo Ron Ron» um embalo característico de outras eras. Homme canta, com a ajuda da guitarra de Alex Turner, e por entre muito swing, afirma: “I wanna suck, I wanna lick, I wanna cry, and I wanna spit, tears of pleasure, tears of pain”. A guitarra ousa soltar-se a meio da corrida e, acreditem, todos ganhamos essa liberdade e sentimos a abençoada descida ao inferno do reverso da escala evolutiva.

O primeiro single deste disco, «My God is the Sun» é, à partida, a música mais radio friendly deste álbum e é um exemplo da canção rock perfeita, com ou sem aspas. O ritmo é completamente delicioso, os instrumentos (grande Grohl!) fundem-se entre si, a voz de Homme é uma pérola em si mesma. Celebra-se o Deus Sol, o deserto, a vida inóspita, a velocidade. Amén, dizemos nós.

Já «Kalopsia» traz outros ritmos, com Josh Homme a assumir posses de crooner numa balada feita à medida de uma quente noite de verão que vê a temperatura elevar-se à medida que as cordas das guitarras são arranhadas, no intervalo das teclas de um suave piano, e se sente a presença mutante de Trent Reznor.
É ainda sob a influência do homem forte dos Nine Inch Nails que chega a dolente «Fairweather Friends», que tem a particularidade de contar com a presença menos óbvia neste disco. Falamos naturalmente de Elton John cujo piano brilha por trás da muralha rock de toda a composição. As vozes são alvo de uma mistura especial e pouco importa quem é quem pois o mais importante é o (brilhante) resultado final, que tem na mestria de Mark Lanegan outro ingrediente de peso.

«Smooth Sailing», que volta a contar com a presença da voz de Jake Shears depois da faixa inaugural do disco, é um puro exercício hedonista que mistura o falsete do vocalista dos Scissor Sisters com a competente rispidez vocal de Homme.

Já perto do final do disco, «I Apear Missing», uma das melhores faixas deste disco, agarra o ouvinte de frente e a cadência fantástica dos ritmos é um convite ao deleite auditivo. A cada minuto que se percorre ao longo desta mini-maratona de 360 segundos, aumenta a cadência lírica, musical e emocional. O lamento da voz de Homme encontra o paralelismo certo na bateria de Grohl bem secundada pelas cordas que libertam electricidade na medida certa. Uma das melhores canções rock que 2013 já ouviu. Para consumir até à exaustão, por favor.

A última e homónima faixa de “Like Clockwork” revela-se lenta e desconcertante a provar que (estes) QOTSA sabem mexer-se em ritmos e toadas diferentes com a mesma capacidade de deslumbrar. Aqui são as teclas do piano que ditam o ritmo agridoce da canção que tem uma alma crescente que assenta amarras no coração do ouvinte.

“Like Clockwork”, o disco, é um álbum com cabeça, tronco, membros e muitos e bons convidados; um trabalho que vem comprovar a inata capacidade de Josh Homme produzir excelentes colecções de canções e reunir a trupe certa. Ainda que não se trate de uma tentativa de estabelecer um qualquer reinado, se o rock tivesse que ter um trono nele estaria sentado o soberano Josh Homme.

In Rua de Baixo

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