quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

“BARBARA”
de CHRISTIAN PETZOLD

Conseguirá Barbara a sua redenção?



Começou hoje o KINO, Mostra de Cinema de Expressão Alemã, e estará em Lisboa até dia 3 de Fevereiro tendo como espaços dedicados o Cinema São Jorge, o Goethe-Institut e o Espaço Nimas.

“Barbara” de Christian Petzold, um dos cineastas mais conceituados do novo cinema germânico, esteve encarregue do arranque deste interessante ciclo de cinema. Apontado pelos responsáveis alemães para a vitória do galardão de Hollywood para o melhor filme estrangeiro, algo que não se concretizaria pois não chegou a ser um dos finalistas, este filme já arrebatou o Urso de Prata no recente Festival de Berlim.

Tendo como base os ecos da eterna Guerra Fria na Alemanha, ainda na era do muro, esta película conta a história de Barbara, representada por Nina Hoss, uma médica pediatra que, depois da tentativa falhada de passar para o bloco ocidental do País ao encontro do namorado, é colocada numa clínica do interior como castigo, deixando um dos hospitais mais afamados de Berlim Leste.

Sempre vigiada pelas autoridades, Barbara vê-se numa nova realidade mas sempre com a ideia da fuga, da liberdade, plano que está a ser levado a cabo por Jorg, companheiro da pediatra. Refugiada em si própria, Barbara revela-se fria, distante, algo que deixa de acontecer quando entra em contacto com os pacientes como que vivendo as suas histórias sempre na tentativa de apaziguar os seus medos, talvez porque não consegue dominar os seus.

Para além de ter um novo apartamento, outro local de trabalho e novos colegas, Barbara precisa de se reencontrar, de traçar um novo rumo, ainda que tenha a ideia fixa de deixar a Cortina de Ferro. Pelo caminho surge André, Ronald Zehrfeld, pediatra local que se tenta aproximar da fria nova colega e que vai desempenhar um papel fundamental no quebrar do gelo de toda a história.

Desconfiada de tudo e todos, Barbara não sabe como encarar a afabilidade do colega mas, aos poucos, vai perdendo esse medo e descobre uma luz que até aí desconhecia ter dentro de si.

Hoss e Petzold, dupla que trabalha junta pela quarta vez, são os trunfos maiores desta muito interessante e competente longa-metragem e do “diálogo” entre realizador e actriz nasce uma história muito compacta. Petzold consegue, como poucos, induzir no espectador sensações, medos e sentimentos que o grande ecrã não mostra de forma declarada. A insegurança e o pânico que daí resultam são mais sugeridos que “palpáveis”. É o poder de sugestão que domina, e alimenta, o cinema e a construção do discurso da arte do realizador.

Para passar a sua mensagem, o realizador utiliza a gramática da ausência face à presença, a sintaxe do vazio em detrimento do facto vivido in loco.

O triângulo entre Barbara, André e o público, bem como a incerteza do final da trama, segura-nos até ao último momento e, ao contrário de outros filmes, não conhecemos o jogo na sua plenitude, o que sugere um sentimento claustrofóbico. Este puzzle de Petzold descobre-se a si próprio numa cadência particular reservando um final em forma de revelação. Mas este é um filme cujo mistério que é alicerçado na insegurança que resulta do acto de espionagem, da falta de confiança em si próprio e de conhecer quem é o verdadeiro inimigo.

A conjuntura política opressiva dos anos 1980 está registada em “Barbara” de uma forma ténue, nunca se revelando em demasia. A tensão é transmitida ao espectador muito subtilmente, obrigando o espectador a ultrapassar o labirinto da ambiguidade pois tudo é, ou pode ser, manipulado.

Nina Hoss é quem mais se salienta neste filme, construindo uma personagem forte, que vai saindo do seu casulo de bipolaridade à medida que o filme avança, conforme vai sentindo mais confiança em si própria, na sua vida, mesmo que isso coloque em causa aquilo que tinha como certo, como garantido.

Barbara, personagem muito rica, ganha uma outra beleza com o passar dos minutos. Os seus cabelos louros acentuam o seu brilho, os olhos azuis tornam-se mais bondosos, a boca consegue sorrir.

O crescimento do personagem central do filme, inicialmente segregado, revela também a grande interpretação de Hoss que aos poucos ganha humanidade. Os percursos de bicicleta pelas florestas vizinhas, por exemplo, servem de via-sacra de forma a fugir de um calvário decretado por terceiros.

Conseguirá Barbara a sua redenção?

in Rua de Baixo

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