segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

“O Fantasma” de Jo Nesbo


Harry Hole é um dos mais interessantes e entusiasmantes personagens dos policiais contemporâneos. Jo Nesbo, seu criador, além de um dos autores mais completos e competentes das últimas duas décadas, tem o condão de aliar uma ímpar mestria de criar thrillers à construção de ambientes envoltos de um negrume típico das sociedades modernas.

Estas são algumas das razões para abraçar “O Fantasma” (D. Quixote, 2015) com a habitual paixão que qualquer fã de um bom policial, nórdico ou não, habitualmente dedica às criações nascidas da mente do autor norueguês.

Ao nono episódio (note-se que a editora D. Quixote tem apresentado os tomos da saga Harry Hole não necessariamente por ordem cronológica, sendo que “Cockroaches”, segundo capítulo da colecção, tem edição portuguesa prevista para o próximo mês), Nesbo faz regressar o ex-polícia à sua Oslo depois de uma passagem por Hong Kong.

Hoje, envergando uma atroz cicatriz na face e com um dedo de titânio, o antigo inspetor enfrenta mais uma terrível provação que o leva a reviver dramas e tramas do passado. Inesperadamente, Oleg, filho de Rakel, é preso. A principal acusação coloca o jovem na pele do principal suspeito de um homicídio. Hole recusa a aceitar a situação, pois o rapaz que ajudou a criar não encaixa no perfil do assassino, decidindo investigar por sua conta e risco todo o mal explicado processo para encontrar o verdadeiro culpado.

Ainda que os tempos de polícia sejam parte do passado, as amizades que Harry ganhou e fomentou enquanto agente da autoridade são agora os aliados “perfeitos” para desvendar este intrincado caso. Só assim poderá embrenhar-se no perigoso e escuro mundo do tráfico de droga que, por estes dias, tem como substância rainha a violin, uma poderosa e viciante forma de afastar a realidade e entrar num mundo de sonho que rapidamente se torna num pesadelo.

Entretanto o perigo espreita a cada esquina de Oslo. O rei do submundo das ruas é conhecido por Dubai, uma espécie de fantasma omnipresente que poucos viram a face mas que todos temem. Conseguirá Hole resolver mais um enigmático e perigoso puzzle?

Para encontrar a resposta resta devorar as mais de 500 páginas de “O Fantasma”, mais um excelente livro de Nesbo que traz aos escaparates uma trama terrífica, com um enredo irrepreensível e um poderoso final construído com ingredientes que misturam corrupção, assassinatos, política e um conflito de interesses egoístas que tornam as pessoas simples peões de um jogo sem regras ou tréguas, onde a confiança é um bem precioso e a traição um modo de vida.

Harry Hole, ex-polícia, ex-marido ou ex-“pai”, sente todo este negrume na pele e na sua mente redopiam verdades, mentiras e medos alimentados por memórias que crescem à boleia de vícios como o álcool, a droga e a sempre presente música.

Todos, directa ou indirectamente, são afectados pelo vício, mas o escritor norueguês aponta também o dedo a outro flagelo: a corrupção que leva políticos a querer pintar uma nova Oslo destinada ao turismo e à promoção económica, preferindo varrer outros problemas para debaixo do tapete.

Neste favorável contexto, as ruas são o palco para rixas entre gangues rivais que controlam cada esquina, cada vida à beira de ser devorada por uma qualquer ratazana (humana). Resta portanto a Hole tentar repôr uma certa justiça para conseguir salvar o nome e a honra de Oleg, seu “filho”, e hoje mais um toxicodependente que aspira por mais uma dose.

As perguntas são muitas, as dúvidas surgem a cada minuto, e Harry vai ter de lutar contra um dos mais empenhados criminosos nascidos da mente de Nesbo. Mais do que uma questão de justiça ou de honra, Harry está determinado a lutar contra o Mal a bem da verdade. Mas será que Hole é hoje um homem capaz de encarar esta verdade?

In deusmelivro

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